domingo, 31 de julho de 2011

Pressa

Érima de Andrade

Vivemos tão acelerados que foi preciso criar um movimento para ter consciência do ritmo que impomos a nossa vida. Carl Honoré , criador do movimento Slow (devagar, em inglês), conta que tomou consciência do ritmo que estava vivendo quando se viu comprando um livro infantil chamado Contos de 1 minuto. “Minha pressa estava fora de controle e eu estava desperdiçando momentos preciosos com meus filhos”, diz ele.

A pressa nem sempre é um problema. Em algumas profissões a pressa é indispensável. Honoré concorda que bombeiros, policiais ou médicos, precisam de velocidade para atender emergências e salvar vidas. “Outra área em que a pressa é essencial é no esporte. A velocidade está em muitas competições e é responsável por grande parte da emoção. Ninguém assistiria a uma competição de vagareza, nem ficaria torcendo pelo último colocado, aquele que conseguiu chegar mais devagar.”

De acordo com Honoré, é preciso questionar a pressa e buscar ver a beleza da lentidão. “A vagareza se tornou uma palavra feia porque nós criamos uma ‘teologia’ da velocidade", comenta. "A velocidade é inquestionavelmente boa, mas, quando a valorizamos demais, acabamos depreciando sua contraparte, a vagareza, e criando um tabu. Só que isso não é verdade. As melhores coisas na vida são feitas devagar."

Se você não trabalha com emergências, nem é um atleta de velocidade, mas a pressa faz parte da sua vida e você vive preocupado com prazos e horários, talvez você esteja vivendo a síndrome da pressa.

Responda as perguntas: seu passo é acelerado, sua fala atropelada e sua escrita é quase sempre abreviada? Você vive de olho no relógio? Está sempre reclamando que não tem tempo para nada? Quase tem um chilique se tem que esperar 10 minutos pelo almoço? Tem vontade de atropelar alguém que anda em um passo mais lento que o seu?

Essas são as características típicas da síndrome da pressa. Mesmo não sendo reconhecida oficialmente pela psiquiatria, ela é estudada desde 1980. Ela não é uma doença, mas uma série de comportamentos que altera significativamente a saúde e a qualidade de vida dos indivíduos.

Os problemas começam quando a pressa não é necessária, mas exigida. “Mesmo quando queremos desacelerar, uma voz dentro de nós fica repetindo para irmos rápido. Acabamos nos sentindo mal se fazemos poucas coisas, ou se demoramos para fazê-las”, ressalta Honoré.

A síndrome da pressa apresenta sinais semelhantes ao do estresse em estágio avançado, e é confundida com ele. Porém, os problemas têm origens diferentes. Enquanto o estresse avançado é uma reação física e psicológica a um evento novo, ameaçador ou angustiante, a síndrome da pressa é desencadeada por um padrão de comportamento em que o próprio indivíduo traz o estresse para si, ou seja, na maioria das vezes, ele próprio transforma sua vida nesse corre-corre sem fim, seja para produzir mais e ter mais retorno financeiro, seja para ter mais reconhecimento no trabalho.

“No contexto de trabalho em que há valorização da produção em detrimento da saúde biopsicossocial, essa pressa só deve ser vista como benéfica se respeitar os ritmos biológicos dos indivíduos e sua saúde, com pausas para exercícios na empresa e paradas tranquilas para descanso e alimentação”, explica Katie Almondes.

O primeiro passo para lidar com essa situação é admitir e entender o problema. O segundo é querer mudar. “Se a pessoa perceber que a pressa está prejudicando seu desempenho e sua qualidade de vida, então é hora de mudar sua postura”, diz Ana Maria Rossi.

A principal dica é tentar buscar um equilíbrio entre os momentos em que é realmente necessário acelerar, com os momentos em que é possível ter um ritmo mais lento. A mudança da rotina é a única forma de inibir a síndrome da pressa, já que essa ainda não tem tratamento específico. Para tanto vale técnicas de relaxamento, exercícios de respiração, atividades físicas e de lazer, ioga e psicoterapia ou outros meios que ajudem a pessoa a relaxar e desacelerar.

Vale também entrar no movimento Slow. Ele tem a intenção de divulgar as possibilidades de se levar uma vida mais plena e desacelerada (movimientoslow.com), e quer “dar ferramentas aos indivíduos para que suas existências não sejam uma mera sucessão de cenários encadeados, desprovidos de emoções.

Hoje mais que nunca, o homem moderno vive perdido numa corrida particular de obstáculos, em que controlar o cronômetro até a o último segundo determina a sua existência. O distanciamento faz da natureza e do seu ritmo, ligado às estações do ano e aos fatores que não podemos controlar, uma miragem nas sociedades ocidentais dos dias de hoje. As cidades tornam-se anônimas e levitamos, absorvidos por nosso peculiar universo de interesses. A pressa é o motor de todas as nossas ações e a cinética do Grand Prix envolve a nossa vida acelerando-a, economizando cada segundo, rendendo culto a uma velocidade que não nos faz ser melhores.

Em última análise, o movimento Slow é uma fonte de prazer, útil para ficar longe de uma vida padronizada e dirigida pelo ponteiro dos minutos do nosso relógio de pulso, subjugada por uma velocidade que sopra longe a nossa capacidade de desfrutar de um momento há muito aguardado, quando este finalmente chega."
  
O site movimientoslow.com coloca a disposição uma série de dicas que ajudam a acalmar a afobação do cotidiano:

. Escreva estas palavras em um lugar visível: fazer várias tarefas ao mesmo tempo é não fazer nenhuma bem;
. Não se force a responder com rapidez, use o tempo que achar necessário;
. Não olhe toda hora para o relógio, e não se preocupe, você saberá à hora;
. Boceje com frequência. Bocejar é bom para a saúde;
. Escute uma peça de música de Mozart no seu tempo original;
. Ao se levantar dedique um tempo a tomar o café da manhã tranquilo e projetar o dia que tem pela frente;
. Pratique um hobbie sossegado... Pescar, pintar, plantar; mas trate de fazer uma só coisa cada vez;
. Coma devagar. Desfrute da solidão ou de uma conversa se está com mais gente;
. Faça uma pausa no seu dia, faça a sesta, você merece;
. Escreva qualquer coisa. Aprofunde-se no dia que teve;
. Saia de casa e pratique a nobre arte do dolce fare niente. Leia um jornal, observe as fachadas;
. Jante um cardápio com alto conteúdo em frutas e verduras;
. Leia um livro na cama, deixe abandonar-se nos seus pensamentos e flua.

“Na vida há algo mais importante que incrementar a sua velocidade.” Gandhi 

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Frutas

Érima de Andrade

Uma boa alimentação faz parte de toda orientação para manter ou restaurar a saúde. Mas afinal, como se alimentar bem? Independente da dieta escolhida, um caminho sem erro e buscar uma alimentação mais natural possível.

Explica Sonia Hirsch no livro Boca Feliz: “Quer dizer: certas comidas agridem a nossa natureza, enquanto outras se integram ao nosso corpo de uma forma completamente natural. Por isso é que se fala comida natural.

Por exemplo, a dona Maria, lá daquele lugarejo do sul de Minas, come comida natural. O feijão vem da roça do Bento, o arroz quem traz é dona Fujiko, o milho e o aipim e as verduras são ali do quintal mesmo e as frutas aparecem conforme Deus vai dando: banana, laranja, tangerina, jaca, mamão, jabuticaba, abacate, cada qual na sua estação. Os ovos também são do quintal, postos todo dia pelas galinhas que têm até nome. E se acontece de comer um frango, um leitão, um cabrito ou uma carne de vaca, todo mundo sabe que o animal era bem tratado e sem nenhuma doença.

Dona Maria tem saúde de ferro.

Muito longe de Minas, lá nas bandas do Maranhão, seu Ribamar também come comida natural: é um peixe, uma caça, um milho, uma farinha de mandioca, um óleo de coco de babaçu, umas folhas de vinagreira cozidas só no bafo da panela, muita castanha-do-pará, banana, coco e todas as frutas que Deus também dá por lá. Seu Ribamar é outro que tem saúde de ferro.”

Fruta é comida natural. E o Brasil, país tropical, tem variedade e fartura, somos, inclusive, o terceiro maior produtor de frutas do mundo! Uma benção desse berço esplêndido. No Japão, um arquipélago, fruta é artigo de luxo. “Uma melancia, por exemplo, pode chegar a custar o equivalente a dois mil reais... Uma manga? Quatrocentos reais!”, segundo escreveu Drika Max na matéria O poder das frutas.


As frutas oferecem grande quantidade de fibras, proteínas, vitaminas, sais minerais e açúcares. Reforçam a saúde e garantem mais qualidade de vida. São compostas basicamente de água, fundamental para manter os tecidos do organismo saudáveis. Elas são de fácil digestão, ativam as funções gástricas e desintoxicam o organismo.

São saborosas, bonitas, coloridas, nutritivas, com sabores e aromas deliciosos e variados. Podem ser consumidas de várias maneiras. Mas nem todos aproveitam essa facilidade e variedade.

Não gosta da versão in natura? Tudo bem. Pode ser em forma de chás ou sucos feitos na hora, sem coar, para aproveitar as fibras.

Segundo Cynthia Antonaccio: "O ideal é que as consuma com a casca, para aproveitar bem as fibras. Mas, se não for possível, pode apelar, com moderação, para geléias, compotas, purês, tortas recheadas e compensar comendo mais verduras cruas e legumes.” Que também são comida natural!

Com tanta variedade, dá para investir em sucos naturais e experimentar novos sabores, misturando frutas, legumes e verduras. O importante é colocar na sua alimentação essa fonte de saúde. Barato, gostoso e fácil de fazer.

Ana Beatriz Vieira Pinheiro, no seu livro Comer com Sabedoria, oferece algumas receitas de sucos, geléias, compotas e outras delícias da comida natural. A seguir, duas receitinhas boas para o inverno. Delicie-se!

Suco de banana com laranja e gengibre – rendimento 200ml

1 banana-prata média (40g)
180 ml de suco de laranja (usar a laranja da safra que estiver bem doce)
1 colher de café de gengibre picado pequeno.

Modo de preparo:
Liquidificar tudo.

Compota mista – rendimento 1,05kg (cerca de 7 porções)

1 maça(150g) descascada, picada em cubos médios
1 pêra (200g) descascada, picada em cubos médios
2 xícaras de morangos (250g) partidos ao meio
¼ abacaxi (250g) picado em cubos
6 damascos frescos ou secos (50g)
6 ameixas secas (50g)
1 manga (250g) descascada, picada em cubos médios
¼ de xícara de chá de suco de limão (50 ml)
1 colher de chá de molho de soja (shoyo) (10 ml)
Cravo e canela em pau a gosto

Modo de preparo:

Colocar todas as frutas picadas numa assadeira.
Acrescentar o suco de limão já misturado com o shoyo.
Espalhar entre as frutas o cravo e pedaços da canela.
Cobrir com papel-manteiga e levar ao forno baixo por 30 minutos.

Bom apetite!!!


domingo, 24 de julho de 2011

Seguindo em frente

Érima de Andrade

De repente, sem você saber exatamente como e porque, você passa por uma situação de perda, uma crise, uma doença, um grande período de estresse, ou qualquer outro acontecimento traumático. Como sair disso?

Primeiro é preciso reconhecer que qualquer situação nos ensina alguma coisa. Foram perdas terríveis? Fizeram grande diferença na sua vida? Vai ajudar a não se tornar vítima novamente? Vai ajudar a se observar para não fazer com os outros?

Não dá para evitar experiências traumáticas, nem situações de conflito, mas podemos escolher como agir quando elas acontecem. Quem consegue superar tragédias, ou sair de períodos difíceis de dor emocional, pode abandonar o papel de vítima e começar uma vida nova. E para começar uma vida nova é preciso ser resiliente.

Resiliência é a reação positiva, a capacidade de superar as adversidades e ser forte durante as crises; a capacidade de se recuperar, de aprender e de ser transformado pelas experiências dolorosas; a capacidade de se desenvolver bem e de se projetar no futuro, com uma visão realista e otimista. “A resiliência é o antidestino”, diz Boris Cyrulnik, “dá trabalho, não é fácil, mas é um espaço de liberdade interior que permite não se submeter às feridas.”

E para ser resiliente é necessário saber perdoar. O perdão é um dos ingredientes necessários para a resiliência. Explica Rosa Argentina Rivas Lacayo, “sem perdão não podemos crescer nem ficar mais fortes com a adversidade. Também não conseguiremos ser flexíveis e resilientes.”

Alguns não querem perdoar, pois acreditam que o perdão contribui para a injustiça. “Se eu perdoar, vão me ferir novamente, vão se aproveitar da minha nobreza...” Outros conservam a dor para mostrar ao mundo como foram maltratados, e nem querem perceber que assim eles se prejudicam.

Os terapeutas americanos Sidnei e Suzanne Simon, em seu livro Forgiveness, explicam o que significa não perdoar. Explicam que não perdoar tem certas vantagens, porque nos dá algumas ilusões.

A primeira é a ilusão de que, se aquele problema não tivesse acontecido, nossa vida seria perfeita. Mas como aquilo aconteceu, temos a explicação ideal, a desculpa perfeita para estarmos e ficarmos na pior. Assumimos o papel de mártires, e ficamos à espera de alguém que resolva milagrosamente a nossa vida. Com essa ilusão a responsabilidade da nossa infelicidade é sempre do outro. E se eu não me responsabilizo por mim, como mudar o que acontece comigo?

A segunda é a ilusão de sermos perfeitos. Os maus, os bandidos, são os que nos machucaram. Dividimos o mundo em bons para um lado e maus para o outro. Se nós perdoarmos vamos ter de aceitar que essa divisão não é possível, somos tão imperfeitos quanto eles. Somos humanos, temos bons e maus sentimentos, que em essência não são nem bons nem maus.  Nós e eles formamos um mesmo grupo.

A terceira é a ilusão da força, do poder – agora eu controlo. Não perdoar compensa a sensação de falta de poder que nós sentimos quando fomos machucados. Não perdoando queremos a sensação de que agora é minha vez: eu controlo, eu estou no comando. Mas na verdade, eu estou numa prisão que é alimentada por raiva, rancor, mágoa, cultivando intranquilidade interior, resultando numa vida azeda, amarga, fechada, desconfiada, sem conseguir se abrir para ninguém.

E a quarta e última ilusão que temos ao não perdoar é de que não seremos machucados outra vez. Acreditamos que vamos reduzir o risco de voltarmos a sofrer rejeição, traição ou qualquer outra forma de ferimento, se mantivermos a dor viva e os olhos bem abertos para qualquer perigo em potencial.
Mas será que vale a pena armazenar mágoas, remoer sentimentos para nos agarrarmos com unhas e dentes à dor do passado? Será que realmente precisamos do ódio e do ressentimento? Ou é uma desculpa para obter menos da vida do que queremos ou merecemos? Perdôo ou fico condicionado pela ferida, pela doença, pelo luto, pelo trauma?

Segundo Maria Helena Matarazzo “o perdão se torna uma possibilidade quando a dor do passado para de reger nossas vidas; quando não precisarmos mais do ódio e do ressentimento como desculpas para obter menos da vida do que queremos ou merecemos. Perdoar é chegar à conclusão de que já odiamos bastante e não queremos odiar mais; portanto, perdoar é usar a energia da vida, não para reprimir esses sentimentos, mas para quebrar o ciclo da dor se voltando para o futuro e não machucando outras pessoas como fomos machucados.”

Fred Luskin explica que “os problemas não solucionados são como aviões que voam dias e semanas sem parar e sem pousar, consumindo recursos que podem ser necessários em caso de emergência. Os aviões do rancor se convertem em fonte de estresse e, muitas vezes, o resultado é um choque. Perdoar é a tranquilidade que se sente quando os aviões pousam.”

O perdão é importante para quem perdoa, não para quem ofendeu. É um processo que vem de dentro. É uma escolha. É recuperar seu poder assumindo a responsabilidade pelo que você sente. É uma libertação. Uma aceitação de que nada se pode fazer pelo passado. É reconhecer que passado é passado e que nada vai mudar esses acontecimentos.

Na realidade, perdoar é aceitar que a coisas ruins podem acontecer e que as pessoas mesmo quando amam, se machucam. O perdão nos aju­da a reconhecer e admitir que somos frágeis e que não precisamos esconder essa fragilidade. Quando nos tornamos conscientes dos nossos limites, evitamos que a experiência se repita. Perdoar é um sentimento de bem-estar, é reconhecer que existe algo melhor que queremos fazer com a energia da vida e fazê-lo.

O perdão não se aplica só aos outros. Se perdoar também é importante. Ser capaz de se perdoar é reconhecer que apesar dos erros e culpas, podemos deixar de nos sentir merecedores de castigo. Não é esquecer nem persistir no erro, é começar de novo com a experiência adquirida.

Como diz Heloisa Capelas: “Reparar o passado e perdoar sempre lhe trará a alegria de sentir-se curado. Respire e sinta-se aqui e agora com o passado no seu lugar e o futuro por vir e você apenas perdoando e respirando. Respirando e perdoando... respire e... sinta-se curado!!!”

É um pre­sente que damos a nós mesmos.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Autoexigência

Érima de Andrade

A autoexigência parte do princípio que a perfeição é possível, que é possível satisfazer a todos, que nunca irá nos faltar talento, criatividade, disposição para produzir... É uma prisão.

Imagina o sofrimento de quem acredita que precisa sempre corresponder a uma presumível excelência. Vive num sufoco comportamental capaz de levar a exaustão com facilidade. O perfeccionista age como o “general de si mesmo”, com dificuldade para delegar e relaxar.

“Pela saúde, há que se conviver com insucessos em razoável aceitação.” Luiz Alca de Sant’Anna


Ninguém é perfeito, todos temos insucessos, fracassos e fases de mediocridade. É um traço comum da nossa humanidade, somos imperfeitos: nossa perfeição está em sermos imperfeitos.

“Ser escravo da perfeição, principalmente a da mídia, é um atestado de burrice. Trata-se de uma condenação à angústia de não atingir seu objetivo. Entretanto, abandonar totalmente a idéia da perfeição pode nos tornar medíocres. A saída está no meio termo, na consciência de que jamais seremos perfeitos, mas que podemos ser excelentes, e mesmo assim, não em tudo, apenas naquilo que escolhermos ser. Precisamos ter algumas utopias, isso é saudável.” explica Eugênio Mussak.

Nós temos defeitos e qualidades, e podemos sempre melhorar, é a nossa singularidade que nos torna pessoas especiais e não a tal da perfeição. Precisamos compreender humildemente que não podemos tudo e que mesmo as pessoas mais positivas passam por duros golpes. O que as mantém positivas é a capacidade de resiliência, ou seja, a capacidade de se recuperar das frustrações, de lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão das situações adversas. E resiliência pode ser ativada e desenvolvida.

Vera Placco conceitua a resiliência como sendo: “a capacidade do indivíduo de responder de forma mais consistente aos desafios e dificuldades, de reagir com flexibilidade e capacidade de recuperação diante desses desafios e circunstâncias desfavoráveis, tendo uma atitude otimista, positiva e perseverante e mantendo um equilíbrio dinâmico durante e após os embates – um aspecto que ativado e desenvolvido, possibilita ao individuo superar-se e às pressões de seu mundo, desenvolver um autoconceito realista, autoconfiança e um senso de autoproteção que considera a abertura ao novo, à mudança, ao outro e à realidade subjacente.”

Em qualquer adversidade, e elas vão acontecer, pois não temos controle sobre todas as alternativas possíveis, temos sempre duas escolhas: ficar se lamentando pelos cantos ou reagir, compreendendo a perda/dificuldade/insucesso/fracasso como um processo necessário de aprendizado.

É preciso coragem para reconhecer nossas imperfeições, mas só assim é possível descobrir onde podemos melhorar e crescer, sem esse reconhecimento, não há mudança.

“A transformação não é uma necessidade... é um fato. Você pode escolher fazê-la por livre arbítrio ou ser atropelado por ela” diz Heloisa Capelas

Aceitação da nossa imperfeição é o primeiro passo para essa transformação.

“Para respeitar como sou, é preciso aceitar quem sou, e para aceitar, preciso conhecer quem sou.” Eliana Rita Guimarães

À medida que você toma consciência da sua singularidade e do quanto você é especial, você passa a dar valor ao que você pode alcançar e ao que você já conquistou, a valorizar o que você tem, ao invés de ficar desejando o que no momento você não se pode ter. E a vida fica bem mais fácil sem essa cobrança.

Como diz Martha Medeiros: “Benditos os que conseguem se deixar em paz. Os que não se cobram por não terem cumprido suas resoluções, que não se culpam por terem falhado. Não se punem por não terem sido perfeitos. Apenas fazem o melhor que podem.”

E fazer sempre o melhor possível, é o que está ao nosso alcance.

domingo, 17 de julho de 2011

Por que fazer terapia?

Érima de Andrade

O que leva alguém a buscar uma terapia, ou qualquer outro trabalho de autoconhecimento?

Todos buscam a mesma coisa, mesmo que não tenham clareza da resposta: independência emocional. Buscam uma maneira de pensar sobre a própria vida e de compreender seus processos internos para conquistarem a independência emocional. Buscam ser mais felizes.

Mas um terapeuta não tem as respostas. Todas as respostas são internas e pessoais. Hermann Hesse define muito bem essa impossibilidade de receber respostas do outro:

"Nada lhe posso dar que já não exista em você mesmo. Não posso abrir-lhe outro mundo de imagens, além daquele que há em sua própria alma. Nada lhe posso dar a não ser a oportunidade, o impulso, a chave. Eu o ajudarei a tornar visível o seu próprio mundo, e isso é tudo".

Fátima A. Bittencourt explica assim por que conhecer a si mesmo:

“Por mais que pareça que os outros escolhem nossos caminhos, sempre tem uma permissão nossa para isso acontecer. Se não existe uma satisfação para onde estes caminhos estão levando é hora de repensar os erros que se repetem e as virtudes que não estão sendo praticadas.

Chamamos esse novo caminhar de autoconhecimento. Esse é o chão que sustenta o caminho escolhido e a base da própria vida. A sabedoria é o que praticamos com o autoconhecimento que adquirimos, e ela é que abre os caminhos para que possamos ser felizes.”

Mas os caminhos só se abrem quando temos a coragem, e ousadia, de viver no momento presente. Segundo Schopenhauer a consequência da fuga do presente é a insatisfação eterna dos que não valorizam o que possuem, desejando sempre coisas distantes. Quando conseguem o que querem, essas pessoas passam imediatamente a desejar outras coisas ainda mais difíceis.

Heloisa Capelas completa: “Outra consequência da fuga do presente é a incapacidade de tomar decisões no momento certo. As pessoas esquecem do que está acontecendo nesse exato momento, só valorizam algo depois que o perdem. Quem só pensa no futuro desaprende a interagir com as coisas que estão diante de seus olhos.”

Solidez é o que conquistamos vivendo o momento presente. Segundo Thich Nhat Hanh:

“Solidez torna possível a nossa felicidade. Alguém que não é estável, alguém que não é sólido não pode ser uma pessoa feliz. Quando você é sólido, as pessoas podem confiar em você. Quando seu amado é sólido, você pode confiar nele. Portanto solidez é algo que você pode oferecer à pessoa que ama, como o frescor.”

Como terapeutas, ou professores de autoconhecimento, podemos oferecer a solidez, podemos ajudar a tornar visível o que esta inconsciente, ajudar a repensar os erros que se repetem, a lembrar o que estão vivendo nesse exato momento, podemos oferecer nossa disponibilidade para ajudar, para ampliar seu campo de visão. Como diz Arthur Schopenhauer: “Todo o homem toma os limites de seu próprio campo de visão como os limites do mundo.” E algumas vezes esse mundo fica muito pequeno e sem graça.

Podemos sim estar perto, mas não podemos resolver. Explica Peter Pál Pelbart:

“Mas os anjos não são deuses. Eles não podem tudo (...)

Os anjos não podem mudar a face do planeta nem dirigir o curso do mundo. No máximo podem tornar mais leve o fardo de uma ou outra vida, de um ou outro momento de uma vida ou outra.

Um pouco como um terapeuta: essa disponibilidade para ouvir, para tocar, essa presença discreta que pode às vezes suscitar um novo começo – mas também essa impotência para determinar, para resolver, para viver no lugar de.”  

O caminho é só seu, mas conte sempre com a nossa ajuda. Por mais difícil que seja acreditar, toda noite escura tem um fim brilhante. Regina Saraceni explica:

“É assim mesmo... antes do amanhecer... a escuridão é grande, mas chegam os raios de luz, trazendo vida para nossos corações. Existe até uma meditação assim, você se levanta antes do Sol nascer, se posiciona em direção ao nascimento dele, senta-se confortavelmente e respira calma e profundamente, prestando atenção na sua respiração. E observa... num momento a luz se faz.”

Não é mágico, algumas vezes não é rápido, mas sempre vale à pena.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Elevadores

Érima de Andrade

Elevadores são um mundo à parte.

Como não tem padronização dos botões, eles acabam tendo também uma linguagem própria, compreendida só pelos iniciados: L, L1, L2, GG, SS, S, A, G1, G2, T, P, E, E1, E2, CC, Co, e sei lá que outras letras eles usam, além dos números, é claro.

Só estive num elevador comercial que tinha legenda, o de um shopping, fora esse, fica por conta da imaginação do passageiro.

De um modo geral, elevador é um espaço mínimo, onde cabem todos os tipos de histórias.

Comigo aconteceu uma vez de entrar num elevador com uma mãe, uma filha e uma avó.

Estávamos no “L1”, primeiro andar com lojas, que no caso correspondia ao térreo, nos elevadores antigos. Eu ia para o 3° andar, o das salas, e elas para o “L2”, segundo andar com lojas.

Depois de fechar a porta, para nossa surpresa o elevador desceu. Foi para o “SS”, subsolo, onde os carros ficam estacionados.

Aliás, bastante comum que isso aconteça, antes de subir, pega alguém que está chamando do estacionamento. Mas para mãe em questão, foi um susto.
Foi como se o elevador tivesse despencado, e quando a porta abriu e ela viu aquele espaço escuro, cheio de carros, parecia mesmo que estava no poço, perto do inferno.

A avó tentava acalmá-la, mostrando o óbvio, que estava tudo bem, só tínhamos descido para garagem.

Porta fechada, começamos a subir e... acaba a luz. Um pânico!

A mulher ficou histérica, a filha, de uns seis anos mais ou menos, percebendo a reação da mãe, teve certeza que estava em perigo e começou a chorar pedindo para tirarem ela dali.

A avó mandava a mãe se controlar e eu “assistia” a tudo em silêncio.

Assistia é modo de dizer, por que a escuridão era total. Provavelmente os fabricantes de elevadores não imaginam que pode faltar luz um dia, nem os botões brilham no escuro.
Pelo tato, achei o botão que tem um sininho desenhado e apertei.

Ele deve existir para fazermos um sonzinho enquanto esperamos a luz voltar, ninguém responde do outro lado. Mas ele apita dentro do elevador, o que só piorou a situação.

Para minha sorte, a luz voltou rápido, ficamos mais ou menos cinco minutos no escuro. A porta abriu e estávamos, de novo, no “L1”.

O que não fez a menor diferença.

Elas sairiam em qualquer andar que ele parasse e a porta abrisse; a mãe saiu correndo, a filha chorando atrás e avó calmamente, como se estivesse muito cansada...

Meu filho fez orientação vocacional com uma psicóloga que atendia no 4° andar de um prédio comercial. Foram dez sessões em grupo. O divertimento era descer de elevador ao final das sessões. Cada dia, um era o “astro principal” de um espetáculo para câmera de vigilância. Faziam caretas, mímicas, dançavam, mas saiam do elevador super sérios, e em silêncio.

A avaliação da performance era dada pela reação da recepcionista, que ficava no térreo, acesso, 1° piso, entrada, recepção, pátio, ou qualquer outro nome usado para designar o andar com acesso a calçada fora do prédio, responsável por vigiar as imagens vindas da câmera.

E o objetivo, claro, era encontrar a moça às gargalhadas. Conseguiram algumas vezes...

Eu fico imaginando que tipo de cena inusitada tira essas pessoas do sério. Ou já viram de tudo e não se surpreendem com mais nada, ou a cada dia assistem a um espetáculo particular...

Visitei uma amiga que mora no terceiro e último andar de um prédio. O elevador lindinho, amplo e totalmente fora de contexto. Tinha botões do zero ao nove, além do “C”.

Para subir, sem nenhuma dúvida, apertei o três, mas para descer, qual deles? O zero fica embaixo, mas não provoca nenhuma reação do elevador. O térreo , ou saída, ou sei lá que nome dar, fica no primeiro andar, botão “1”.

Vai ver a construtora conseguiu um desconto na hora da compra, já que não tem a menor possibilidade do prédio ganhar sete andares extras. Mas custava alguma coisa cobrir os botões que não fazem parte do prédio? Ou deixa-los em branco?

Exagero é sempre ruim... Outro elevador que conheci também peca pelo excesso. Alguém deve ter dito numa reunião de condomínio que espelhos ampliam o ambiente. Prédio antigo, elevador pequeno, vamos colocar espelhos! Que idéia genial!

Ficou horrível!

Forraram o teto e as três paredes totalmente de espelhos. Em vez de ampliar o ambiente, ele diminui, e fica lotado com a sua imagem refletida centenas de vezes! É sufocante.

E os novos elevadores inteligentes? Imagino que só funcionem em prédios comerciais. Antes de entrar num elevador, a gente digita o andar e um painel mostra qual dos elevadores disponíveis vai parar no andar solicitado.

Eu morava no 16° andar. Imagina se no meu prédio tivesse um elevador assim? Você marca o 16, entra no elevador, lembra que gostaria de passar na casa da vizinha que é no 12, e não pode mudar de idéia. O elevador não lhe dá essa alternativa... Mas em compensação conversa com você, “porta abrindo, porta fechando, terceiro andar”... conta tudo... muito educado.

E com a opção de ver as horas, saber a temperatura, faltou só àquelas curiosidades que aprendíamos na rádio-relógio, ai seria perfeito! Educado, cumprimenta, abre a porta para você e ainda arranja assunto para o dia todo, realmente, um sonho de tecnologia!

domingo, 10 de julho de 2011

Tensões

Érima de Andrade

No dicionário, tensão é estado de nervosismo e ansiedade; situação de conflito; estado do que está tenso.

E a tensão muscular, um estado de rigidez que se manifesta em certas partes do corpo.

Rigidez... a mesma rigidez que limita os movimentos do corpo, limita a flexibilidade emocional. Nossas emoções estão armazenadas no nosso corpo. Toda tensão física, ou psicológica, provoca um aumento da tensão muscular.

Para Ken Dychtwald “o corpo e a mente são um reflexo do outro e as emoções e experiências da personalidade, influenciam na formação e na estrutura dos músculos e tecidos.”

Ele acrescenta que “há evidências no sentido de que nossos sentimentos e atitudes afetam de maneira muito direta o modo como nos portamos, movemos, respiramos, crescemos, sendo tanto parte de nós mesmos quanto a atividade física, de tal forma que moldamos a nós mesmos segundo atividades físicas e experiências emocionais seletivas. A estimulação emocional dos músculos pode ter sobre o corpo o mesmo efeito que a atividade puramente física, exceto que é em geral mais difícil detectar a fonte da estimulação e a maneira pela qual foi seletivamente e, em muitos casos, inconscientemente praticada.”

Ida Rolf afirma que “a soma total das tensões musculares constitui a expressão corporal do organismo. A rigidificação progressiva do corpo serve também para limitar a amplitude de flexibilidade emocional, da qual é capaz o corpo livre de restrições.”

Para Alexander Lowen uma pessoa é a soma de suas experiências de vida sendo estas registradas em sua personalidade e estruturadas em seu corpo. Ele coloca os processos energéticos do corpo como determinantes do que acontece na mente, da mesma forma que determinam o que acontecem no corpo. E explica que “as emoções estão armazenadas no corpo e existe uma ordem geral para esse armazenar. Por exemplo: sentimentos e lembranças de ter sido deixado de lado, negligenciado, aparecem repetidamente quando é massageado no peito. Quando o trabalho é no alto das costas, é muitas vezes acompanhada por fortes sentimentos de raiva e ódio. Os queixos massageados liberam tristezas, os quadris, sexualidade, os ombros contam histórias de cargas pesadas e de responsabilidades.”

Pode ser que você não se dê conta da sua tensão, mesmo assim, criar o hábito da automassagem só trará benefícios. Ela pode, por exemplo, funcionar como método preventivo de dores, mal-estar e tensões.

A automassagem pode ser feita em qualquer horário e não precisa de nenhum creme ou óleo para massagear. Pode ser inclusive na hora do banho, com a ajuda de esponjas vegetais, massageando bem todo o corpo, principalmente pontos doloridos, para aliviar a tensão. A automassagem desenvolve confiança, cuidado e contribui para a melhora da auto-estima e do autoconhecimento.

Não há segredos para praticar a automassagem, mas é preciso tomar alguns cuidados:

- o toque deve ser pele com pele, sem usar as unhas;
- não faça força nas mãos contra o corpo, apenas seja firme, carinhoso e cuidadoso;
- não pense nos problemas enquanto faz a massagem, concentre-se apenas no seu exercício e nas sensações do seu corpo;
- não pare no meio, permita-se viver intensamente essa experiência.

Faça o seu roteiro, ou inicie pelos pés, massageando dedo por dedo e depois os pés como um todo. A seguir, suba por suas pernas, massageando do tornozelo a bacia.

Continue sua massagem com as duas mãos no quadril, fazendo movimentos semicirculares, de baixo para cima, até o ombro. Lembre-se de massagear também a lateral do seu tronco.

Vá para suas costas, deslize as mãos, de cima para baixo, começando no ponto mais alto que alcançar, percorrendo as laterais da coluna vertebral até o cóccix. Massageie então suas nádegas. Sinta a musculatura soltar dos seus ossos. Suba pelas costas, neste mesmo movimento, até onde suas mãos alcançarem.

Passe para os ombros, braços e mãos. Com a mão cruzada, segure seu ombro esquerdo, e com um movimento de pressão de dedos e palma, massageie ombro, braço, antebraço e mãos. Troque de ombro e repita o movimento. Depois massageie a palma da mão, do punho para os dedos. Lembre-se sempre de fazer os dois lados.

Agora posicione as mãos em forma de pinça e faça movimentos na nuca, descendo e subindo pelo pescoço. Com o mesmo movimento, siga o contorno do couro cabeludo, puxando em cada vez, um pouco de cabelo. Não use força, seja firme.

Pressione o couro cabeludo em toda sua extensão com as pontas dos dedos, fazendo movimentos circulares, como se estivesse espalhando o xampu. Com o polegar e o indicador massageie ao redor da linha do couro cabeludo, massageando também suas orelhas.

E finalmente o rosto. Percorra toda face e a testa fazendo movimentos circulares com as pontas dos dedos. Com o polegar e o indicador massageie seu maxilar do queixo para a orelha. Depois do canto da boca para a orelha, e da aba do nariz até a orelha. Use o dedo anular, o mais leve da mão, para tocar com suavidade a região dos olhos. Com leveza, pressione o dedo e massageie a pele ao redor dos olhos.

Com as pontas dos dedos sobre as sobrancelhas, empurre a testa para o couro cabeludo, com se tirasse uma touca apertada. Com as mãos na horizontal, vá da testa até o queixo. Ao passar pelos olhos feche-os e faça uma leve pressão.

Agora esfregue uma mão na outra, e com os olhos fechados, coloque as mãos em concha sobre o rosto. Mantenha um pouco. Repita o movimento, e coloque as mãos naquele ponto que você sente que ainda precisa relaxar um pouco mais.

Termine sua automassagem dando uma boa espreguiçada.

Tenha um bom dia!

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Afinidade

Érima de Andrade

Esse texto escrito pelo Artur da Távola define/explica o que é esse sentimento/sensação tão especial.

Boa leitura!


"Não é o mais brilhante, mas é o mais sutil, delicado e penetrante dos sentimentos. O mais independente também. Não importam o tempo, a ausência, os adiamentos, as distâncias, as impossibilidades: quando há afinidade, qualquer reencontro retoma a relação, o diálogo, a conversa, o afeto, no exato ponto em que ele foi interrompido, ontem ou há 40 anos.
                                   
É não haver tempo mediando a vida. É uma vitória do adivinhado sobre o real. Do subjetivo sobre o objetivo. Do permanente sobre o passageiro. Do básico sobre o superficial. É rara. Mas quando existe não precisa de códigos verbais para se manifestar. Ela existia antes do conhecimento, irradia durante e permanece depois que as pessoas deixaram de estar juntas.
                                   
O que você tem dificuldade de expressar a um não afim, sai simples e claro de sua boca diante de alguém com quem tem afinidade. É ficar de longe pensando parecido a respeito dos mesmos fatos que impressionam, comovem ou mobilizam. É ficar conversando sem trocar uma palavra. É receber o que vem do outro com uma aceitação anterior ao entendimento. É sentir com. Nem sentir “contra”, nem sentir “para”, nem sentir “pelo”.
                                   
É sentimento singular, discreto. Não precisa nem do amor. Pode existir quando ele está presente ou quando não está. Independe dele mesmo sendo sua filha. Pode existir a quilômetros de distância. É adivinhado na maneira de falar, de escrever, de andar, até de respirar. É linguagem secreta do cérebro, ainda não estudada.
                                   
Além de prescindir do tempo e ser a ele superior, ela vence a morte porque cada um de nós traz afinidades ancestrais no inconsciente e que se prolongam nas células dos que nascem de nós e vão para encontrar sintonias futuras nas quais estaremos presentes mesmo mortos (mortos?) há tantos anos. É ter estragos semelhantes e iguais esperanças permanecentes. É conversar no silêncio, tanto das possibilidades exercidas quanto das impossibilidades vividas.
                                   
É retomar a relação no ponto em que parou sem lamentar o tempo da separação. Porque ele (tempo) e ela (separação) nunca existiram. Foram apenas a oportunidade dada (tirada) pela vida, para que a maturação comum pudesse se dar. E para que cada pessoa possa ser, cada vez mais, a expressão do outro sob a forma ampliada e refletida do eu individual aprimorado. Sensível é a afinidade. E exigente, apenas de uma coisa: que as pessoas evoluam parecido. Que a erosão, amadurecimento ou aperfeiçoamento sejam do mesmo grau. É o mais sutil e delicado dos sentimentos." 
                                 
                                                                                                                
Artur da Távola