domingo, 30 de outubro de 2016

Tudo passa?

Érima de Andrade

A morte nos traz vida, por mais contraditório que isso possa parecer, é assim. A morte nos abre um portal para que as pequenas coisas, as dificuldades, o que nos era uma grande batalha, se torne apenas uma folha seca se desprendendo da árvore... quando há conexão entre a sua alma e a alma da pessoa falecida, se estende um raio de luz entre o seu coração e o céu onde está a pessoa. Não existe incompreensão, os mistérios são revelados e a vida eterna é tão simples de se compreender quanto entender que dormimos e acordamos.” Julia Signer

Julia compartilhou essa reflexão quando perdeu uma pessoa próxima e muito querida. Gosto muito do que ela escreveu, pois confirma, que se você escolher, até na dor você vai descobrir alguma coisa boa.

Mas isso significa que tudo passa? Depende do que você entende por tudo. Sim, o tempo vai passar e aquele evento vai ficar no passado. Se você permitir. Se não permitir você pode reviver a dor diariamente, e ela se manterá presente. É uma escolha.

É bom que se diga, que tudo passa, mas não voltará a ser como antes. Então, o que afinal passa? Passa a estranheza com a nova situação. Passa a dor do momento. Passa a sensação de estar tudo fora do lugar.

Uma vez rompido, rompido está. Não tem como voltar ao antigo eu, você foi transformado por essa situação. Não se tornará inteiro de novo, mas pode ser remendado, e com isso você volta a uma normalidade similar à que você vivia antes do trauma. A tudo se acostuma. Essa é a maior qualidade dos seres humanos, nos adaptamos. E aprendemos.

Eu, por exemplo, aprendi que é muito cansativo ouvir, enquanto você vive uma situação difícil, que tudo passa. É verdade, passa. Mas saber disso, no meio de um turbilhão, pode não ser o suficiente para ajudar.

Oferecer amor e consolo é uma arte. É preciso mesmo alguma sensibilidade para oferecer consolo. Acredito que arte é isso, sensibilidade. E que a sensibilidade é uma propensão natural do ser humano de se deixar levar por afetos de ternura e compaixão. E como ajuda nas horas difíceis.

Não existe uma maneira certa de agir, uma resposta que caiba em todas as situações, mas se você quiser ajudar efetivamente alguém que passou por um trauma, ofereça a sua presença. Você vai descobrir que existem muitas expressões não verbais de amor ao se colocar presente com sua sensibilidade. O amor é muito curativo.

Não é preciso ser culto, informado ou estudado para ajudar. Não precisa de nenhuma habilidade especifica. A sensibilidade é uma capacidade que não precisa de escola ou estudos para ser desenvolvida. A vida lhe ensina a ser sensível.

Precisa falar alguma coisa nessas horas? Não, definitivamente não. Precisa da sua presença, você precisa de fato estar lá. Mesmo sem toque, mesmo que em silêncio, estar lá será o suficiente.

Que fique claro, estar presente não é invadir a vida do outro. É estar disponível inclusive para deixa-lo a sós, se assim ele escolher.

Estar presente é se colocar à disposição da necessidade do outro. Para um abraço, para segurar na mão, para estar do lado em silêncio, para oferecer sua escuta amorosa, ou seu ombro amigo, ou suas habilidades pessoais para dar algum conforto nesse momento.

E pode ser uma presença de maneira bem prática, como atender as ligações, preparar uma sopa, ou uma refeição leve, ou ainda estar ali para acompanhar nas tarefas de rotina, que nessas horas, a rotina, tem a função preciosa de nos dar segurança.

Acompanhar é a palavra a ser destacada aqui. Não tente fazer do seu jeito, não julgue, não controle, não tente resolver. Esteja junto, respeitando o tempo do outro de lidar com sua dor.

É bom também colocar atenção e ser cuidadoso com o que fala. Um discurso otimista, ensaiado, pode fazer um estrago bem grande. Se você não acredita no que está falando, você não ajuda de maneira nenhuma. Então seja sincero e positivo. Lembrando que ser positivo é olhar o que lhe acontece no momento e agir de acordo.

Não compare. Você de fato não sabe o que a pessoa está sentindo, e pode usar um exemplo infeliz, que além de não ajudar em nada, pode piorar a dor.

Resumindo, se você quiser ajudar alguém, esteja presente sem tentar controlar nem alterar a situação básica. A natureza vai seguir seu curso, e, com sua presença positiva e aberta para a dor do outro, você vai dar a quem sofre, a dignidade do seu próprio processo de cura.

Estar ali, nos momentos de dor e escuridão, agindo de forma prática, rotineira, simples e direta, é sempre a melhor maneira de ajudar.

E você também se beneficia. Ao doar o que você tem de melhor, você cria um espaço para o que você tem a receber.
Sempre, uma mão lava a outra.

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