domingo, 2 de outubro de 2016

Precisa escolher?

Érima de Andrade

Precisa. Se for consciente melhor.
Se não for consciente, você vai se enganar e dizer que não escolheu. Mas não escolher também é uma escolha. E foi a escolha que você fez ao não escolher.

E o que acontece com quem não escolhe?
Vai sendo levado por caminhos que os outros escolheram para você. E um belo dia se dá conta que chegou num lugar que não queria, que está fazendo uma coisa que não gosta, vivendo uma vida que não é a que sonhou para você.

“É tradição na minha família seguir por esse caminho, fazer essa escolha. E já que eu tenho vocação mesmo para isso, vou por aí.”

Tradição, vocação, não são suficientes.
Mostram caminhos, mas você precisa escolher seguir por ele. É esse o caminho que vai lhe fazer feliz? Você está escolhendo o que quer para a sua vida? Você está se respeitando ao fazer essa escolha? Se sim, siga em frente. Se não, pense de novo.

A vantagem de ter conhecidos que já fizeram o caminho, é poder conversar com eles a respeito. Procure saber como é o dia a dia dessa caminhada,
saber o que precisaram abrir mão para seguir nesse rumo.

Todas as escolhas têm dois lados, é preciso, para escolher com consciência, saber o que de positivo e o que de negativo tem nesse caminho. Se a pessoa escolheu, para ela, o positivo superou o negativo. Mas pode ser que, para você, o pouco negativo existente seja muito para suas habilidades, potenciais ou conhecimento.

E se na hora de escolher, profissão por exemplo, você não tiver alguém da família na carreira que você sonha, corra atrás de conversar com quem já está trabalhando nisso.

Por exemplo, já ouvi de uma paciente, “vou ser pediatra, gosto muito de crianças.” Era tudo o que ela sabia de pediatria, que trabalhava com crianças. Não pensou muito a respeito, mas estava convicta de ter feito uma boa escolha. Verdade seja dita, no meio do fundamental ainda teria muito tempo para pesquisas.

Conversamos: você gosta de cuidar de crianças? Já se deu conta que a maioria das visitas ao pediatra acontecem quando a criança está sofrendo com algum sintoma? É com essa criança que você quer trabalhar?

“Não. Eu gosto de brincar com crianças, de diverti-las.”


Então, para brincar com crianças existem muitos outros caminhos, inclusive na área da saúde. Crianças que precisam de estímulos para o desenvolvimento motor, nutricional, afetivo, ou intelectual, por exemplo, são estimuladas com brincadeiras. Ou na educação. Ou nas artes. Você pode trabalhar brincando com crianças de muitas maneiras, não precisa ser pediatra.

Ficou de pensar a respeito.

Para uma escolha consciente de profissão, ou de candidato a um cargo público, é fundamental se informar. O candidato vai influenciar sua vida por quatro anos, ou pelo tempo que durar seu cargo. Sua profissão vai influenciar sua vida por muito mais tempo.

Claro que dá para mudar de profissão, mas se você escolher a área de seu real interesse, aprender vira uma diversão, se atualizar vira um prazer, conversar sobre o assunto será sempre interessante.

Um dos meus pacientes já está cursando medicina. Quando começou a estagiar, um dia chegou irritado ao meu consultório, reclamando de só atender pacientes com as mesmas queixas. Fazia estágio numa clínica de gastroenterologia.

Então...

É um estágio obrigatório? “Sim.”

Descubra o que tem de positivo nesse estágio para não ficar sofrendo com ele pelo tempo que ele durar, já que você precisa completa-lo. Sempre tem algo bom, foque nisso.

Aproveite para aprender sobre essa clientela, você só vai mesmo ouvir queixas, nessa clínica, sobre o aparelho digestivo. E já faça uma anotação mental: não é essa a clientela que você quer trabalhar.

“Mas qualquer área que eu escolher, todos vão chegar com as mesmas queixas?”

É possível que sim. Só conseguimos estudar seres humanos porque somos todos muito iguais. Uma coisa que você aprende com a evolução de um paciente, serve para os próximos pacientes que você for atender. Mas se o seu desejo é variedade, converse com o coordenador do seu curso, ele é a pessoa certa para lhe responder se dentro da medicina tem uma aérea que você vai ter variedade de queixas.

Falar com alguém da área é o melhor caminho para tirar dúvidas. Só reclamar não muda a situação.

Atualmente, esse paciente, está fazendo estágio num pronto socorro, e está amando. É possível que siga nesse caminho.

Falo de mudar de profissão com conhecimento de causa. Provavelmente já contei isso aqui no blog. Geminiana, curiosidade em milhares de profissões, fui fazer orientação vocacional. Tinha dúvida entre três caminhos e precisava escolher um para me inscrever no vestibular. Ao fim das sessões com a orientadora, recebi o veredito: “qualquer uma dessas doze(12!) carreiras que você escolher, você será bem sucedida.”

Parece bom? Não é...

É bom porque você aprende muita coisa. É ruim por ter sempre uma frustração do tipo, “ainda não é isso...”

Comecei fazendo comunicação visual, afinal sempre tive jeito com desenho. Nesse caso segui uma vocação, mas não era de fato uma escolha. Era apenas para sair da encruzilhada que me colocou a orientadora vocacional.

Não era bem isso, então pedi transferência para cenografia e indumentária. Também não era esse, mudei de novo para composição paisagística, ao mesmo tempo que fiz vestibular e comecei a cursar educação física. Me formei, fiz um jardinzinho, mas comecei mesmo a trabalhar dando aulas de natação.

Achava uma delícia adaptar bebes ao meio líquido, e tirar medo de adultos que não sabiam nadar. E ao mesmo tempo sabia que seria profundamente infeliz se trabalhasse com isso oito horas por dia...

Até que conheci a terapia ocupacional e uso no consultório tudo que aprendi nesse caminho.

O que poderia ter sido diferente nessa minha trajetória? A informação.

Hoje em dia não tem desculpa de não saber como é essa profissão, ou quem é esse candidato, ou que efeito isso ou aquilo terá sobre você. Informação é o que não falta da internet. E na maioria das vezes, de boa qualidade.

Faz parte do amadurecimento se responsabilizar pelas consequências das suas escolhas. Você vai sim colher o que plantar.

Mesmo que você peça ajuda, e tudo bem pedir ajuda, no máximo o que você vai conseguir é que lhe mostrem o caminho. Caminhar por ele será sempre uma escolha sua. Reconheça essa realidade, você está onde se coloca. Ninguém pode escolher por você.

A querida Cíntia Schwab explica muito bem os limites da nossa ajuda possível:

“Talvez, um dos primeiros aprendizados de um jovem terapeuta seja a aceitação da sua própria impotência. Ele aprende que não tem poder para mudar a vida das pessoas e que as pessoas é que mudam suas próprias vidas, sendo ele um "abridor de cortinas". O terapeuta abre as cortinas (e isso já é muito). A decisão de caminhar o novo caminho não é dele. É daquele que procurou a sua ajuda.”

A gente sempre torce para que tudo dê certo com vocês, mas já sabemos que a escolha não é nossa.

Se isso lhe ajudar a caminhar, saiba que a ação cura o medo. Ficar parado reclamando não leva a mudança alguma.

Saiba também que a informação salva vidas. Informação salva aquela pessoa em perigo, mas salva também você de ter uma vida desinteressante. Informe-se.

Não abra mão de saber. Você merece fazer escolhas conscientes.

2 comentários:

  1. Muito obrigada por esse texto. Estou passando por um período de muita auto-análise (profissional, sentimental, familiar) e ler textos como o seu são de muita ajuda. Sempre passo por aqui, mas não costumo comentar... Achei que dessa vez devia.

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    1. Obrigada por ler Ana Clara. Que bom que pude colaborar. Fique bem.

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