domingo, 23 de novembro de 2014

Câncer de mama? Passou!

Érima de Andrade 

Durante o tratamento do câncer de mama o que eu mais ouvi foi: vai passar. É verdade, passa. Mas quando você esta no meio do fogo cruzado o “vai passar”, em mim pelo menos, começou a dar uma profunda irritação. Não queria o futuro, “vai passar”, queria o passado, “passou”. E agora eu posso afirmar passa, como tudo na vida passa, e o câncer de mama passou mesmo! As pessoas estavam certas, essa página eu virei!

Descobri o câncer no ano passado, primeiro no autoexame, depois com o ginecologista e por fim com a mamografia. Tudo isso porque eu não acreditei quando senti o caroço, achava que era tensão muscular, que afinal eu tinha os dois lados tensos, então não devia ser nada demais.

Quando o ginecologista me examinou, falou de um caroço e da necessidade de um exame de imagens, eu mesmo assim, duvidei. Sem nenhum histórico de câncer na família, boa qualidade de vida, alimentação saudável, hidratação adequada, sono de qualidade, atividade física regular, meditação com frequência, tudo certo comigo, é claro que não podia ser nada de preocupante. E ainda pensei: mas será que ele não consegue perceber o que é uma contração muscular? Quanta prepotência...

Exame feito e no diagnóstico a indicação de uma biópsia. Começou a cair a ficha...
E agora, o que falar para a família? Como falar? Como contar isso para as pessoas? Meus pais foram cautelosos: vamos esperar os resultados e ver o que tem para fazer. Meu filho foi objetivo: tira e pronto, nada de enrolar.

Tira... parece que é fácil assim. Exames, marcações, agendamentos e enquanto o tempo passava, o bico do meu seio começou a entrar. Aí não tinha mais jeito, era mesmo câncer e eu teria que aprender a lidar com isso.

Recebi todo tipo de orientação das minhas amigas naturalistas e esotéricas, entre elas a de tomar óleo essencial de limão para o tumor diminuir e a operação ser menos traumática. Acreditei, fiz tudo o que sugeriram.

Se você está lendo isso em busca de esperança, sinto lhe informar, têm esperanças sim, mas só se você tomar os remédios. Porque um mês inteiro tomando o óleo de limão várias vezes por dia e o tumor cresceu. A minha reação quando o médico viu a imagem e disse que estava maior que o último exame foi um misto de incredulidade, frustração, decepção, raiva, impotência, injustiça e vergonha. Vergonha de ter acreditado, vergonha de duvidar do tratamento que estava sendo planejado para mim, vergonha sei lá do que.

O tumor estava lá, bem disposto, crescendo, era hora de tratar. Primeira providência: tirar. No meu caso, para tirar o tumor foi preciso tirar a mama toda. Não é fácil, não é bonito, mas eu tinha tão claro que aquilo estava me curando que não tive nenhum sofrimento extra. Nunca tinha visto um peito mastectomizado, mas me preparei psicologicamente, e deu certo, não me choquei com a imagem.

A opção da equipe que me operou, mastologista e cirurgião plástico, foi colocar um expansor para preparar a pele para a reconstrução. Dreno tirado, cicatrização completada e começa a expansão. É muito legal! O cirurgião vai, aos poucos, colocando soro fisiológico no expansor e o peito vai tomando forma. Aos poucos mesmo, coloca um pouquinho, espera a pele expandir, coloca mais um pouco e assim vai. Várias semanas nessa função. E o peito vai de novo aparecendo.

Mas tirar não é o suficiente, principalmente porque o meu já tinha infiltrado na axila. Não era um tumor solto, sem afetar nada. Tinha perninhas e era preciso ter certeza que não havia ficado nenhum pedaço pronto para me atacar. Estratégia: atacar antes. E aí começa a quimioterapia.

Como tenho veias finas, escondidas e difíceis, antes de começar a quimioterapia, precisei implantar um cateter de acesso. Isso feito, vamos às sessões.

Uma amiga sugeriu que eu mentalizasse: é a cura entrando. Pois é, tem que ter isso bem claro mesmo, porque a coisa é uma bomba química. O organismo faz de tudo para eliminar aquela agressão e vomitar é apenas uma das estratégias.

Eu já sabia que o cabelo ia cair, e segui a dica de cortar bem curto antes que isso acontecesse para o choque não ser muito grande. E cai. Imaginei que fosse deixar cair sozinho, mas não deu. Mesmo curtinho, caindo aos poucos vai sujando a casa toda, as roupas, os lençóis, é bem ruim. Raspei a cabeça. E tenho que contar, deu um alívio. Aquele monte de cabelo caindo ao meu redor realmente estava me fazendo mal. Imagina se eu não tivesse cortado antes? Deve ser muito pior...

Ganhei vários chapéus, lenços, enfeites de cabeça. Até comecei a usar, mas não consegui. Fica muito bonito, mas esquenta demais a cabeça. Eu já tinha tanto desconforto por causa da quimioterapia, não precisava de mais esse. Assumi a careca. Não sei se é assim com todo mundo, mas não passei por ninguém na rua que se surpreendesse, não me percebi chamando atenção extra. Me senti sempre muito respeitada. Sou muito grata por esse respeito.

Não é só vomitar o efeito colateral, as taxas do sangue ficam totalmente alteradas. Numa das sessões de quimioterapia, minha imunidade caiu tanto que precisei ser internada. Oito dias no hospital. Como também estava muito anêmica, também precisei de transfusão de sangue. E mesmo com tudo isso eu estava agradecida. Minha família esteve comigo o tempo todo, a equipe me fazia sentir acolhida, os amigos marcavam presença. Mesmo que por telefone, poder contar com toda essa gente foi fundamental para minha sanidade durante todo esse tratamento. .

Fim da série vermelha de quimioterapia, a série braba, e começa a série branca, bem mais suave. O sangue já não fica tão alterado, a prostração melhora, a energia fica outra. Mas não é soro fisiológico, é remédio, e também tem toxicidade, tem efeitos colaterais. O que mais me incomodou foi a dormência nas mãos e pés. No auge da dormência eu tinha instabilidade na hora de andar, tinha medo de cair. Também me atrapalhava para escrever, escovar os dentes, segurar os talheres, fechar botões. Mas isso também passou. Quer dizer, passou essa brabeza toda, ainda sinto as extremidades dormentes, bem menos, e vou ficar assim pelo tempo que o meu organismo levar para eliminar todo o remédio. Exercícios ajudam nessa eliminação, estou tentando tornar um hábito a caminhada. Ainda não consegui, mas não desisti.

No fim da série branca começa a radioterapia. Ela não afeta o sangue, mas dá uma lombeira... sabe uma preguiça, uma falta de vontade de fazer as coisas? Não é sem folego, é sem animo. E como todo o resto, isso também passou. Na radioterapia a pele sofre muito. Fui orientada a usar um creme e segui direitinho. Minha pele escureceu, esquentou, mas não ficou vermelha. Vi algumas mulheres com vermelhidão e soube que eu teria ficado assim senão tivesse me cuidado. Mas sou obediente, segui a risca a dica do médico.

E fim do tratamento! Quer dizer, fim dessa maratona. Agora é fazer acompanhamento com o oncologista para ter certeza que não voltou, e tomar por 10 anos o remédio que vai ajudar a não voltar.

A mama? Ainda preciso reconstruir, por enquanto, por causa do expansor, tenho um peito de soro fisiológico. Mas cirurgia só ano que vem, quando os efeitos da quimioterapia e da radioterapia deixarem, para sempre, o meu organismo.

Os cabelos? Voltaram a crescer. A pele? Cada vez melhor. Tudo, aos poucos voltando a normalidade.

Um ano envolvida nessa história, mas passou. Vou ser eternamente grata os meus pais Dirma e Ediemir; aos meus filhos Enrico (um companheirão!) e Paula; as minhas irmãs Érida, Edma e Édira; ao meu irmão Ediemir; a minha prima Vivian; ao meu cunhado Gerah, as minhas amigas Fatinha e Selma. Sou grata ainda as amigas da academia que me deram muita força, dividiram comigo histórias vitoriosas, compartilharam suas experiências de quando elas mesmas passaram por isso. E as amigas da meditação, que me fizeram sentir que sempre estive no grupo, mesmo quando era impossível participar. Sou grata aos vizinhos e as amigas que apareceram para dar uma força. Aos vários telefonemas e aos muitos e-mails e recados que recebi. Também sou grata as minhas amigas Márcia e Elis, que como eu passaram esse ano na luta contra o câncer, em outros lugares, mas trocar ideias com elas, que estavam passando o mesmo que eu foi especial demais.

E claro, não dá para não agradecer para sempre aos médicos Alexandre Vianna, Ricardo Salgado e Affonso Accorsi que foram, e são, anjos especiais na minha vida. E a Naja Jasarovic, fisioterapeuta, que me ajudou a não deixar o meu braço congelar depois de tudo isso.

Câncer é ruim? É sim, muito! Mas tem solução, tem saída, mas você precisa fazer a sua parte. Então não vacile, cuide-se, se examine. Responsabilize-se e tudo vai dar certo. E quando você menos esperar, passou.

 

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