domingo, 18 de fevereiro de 2018

E se eu não fizer nada?

Érima de Andrade

Amo o perfume do manacá. Comprei uma muda, plantei no meu quintal. Ela cresceu, floresceu e segue muito bem, obrigada.

Na terra que veio com ela, veio junto a semente de uma outra planta, uma árvore, que não conheço. Eu sempre penso que, senão matar minha muda, eu não preciso arrancar.
Considero que é um presente e deixo nascer. E ela brotou, uma árvore de crescimento rápido. Tudo ia bem até que ela começou a ficar alta demais. Cresceu com aquela aparência de árvore de floresta fechada, alta com o tronco fino. Ai começou a criar problemas… um vento um pouco mais forte colocava em risco meu telhado.

Cortei a árvore. Uma poda drástica com a intenção de podá-la sempre que volte a ficar alta. Não preciso matá-la para proteger meu telhado.
Sabia que voltaria a brotar, então deixei apenas um metro de tronco. E me surpreendi com a “reação” dela. Além de começar a brotar no tronco, de todas as raízes também brotaram rebentos, ou seja, novas árvores. De uma árvore cortada parece que pode surgir uma nova floresta. E isso é sempre impressionante. 


Ela não morreu em nenhum momento, nem era essa a intenção, mas dá para dizer que voltou a vida. Os brotos anunciam que ela vai se regenerar. A natureza realmente se recompõe, é só dar espaço. 

Uma pesquisa rápida confirma que algumas árvores reagem à poda fazendo brotar novos rebentos da sua raiz. Algumas árvores têm a particularidade de emitir, a uma certa distância do tronco, novos rebentos a partir do seu sistema radicular, mas que progressivamente se libertam da raiz original para levar uma vida independente. Removê-los não mata as raízes e pode até estimular o surgimento de outros rebentos. 

Por mais que isso seja impressionante, aqui não é possível deixar seguir, a menos que eu queira matar a árvore-mãe, e não quero.
Os que nasceram aqui em casa, não tem distância suficiente do tronco para se tornar independentes sozinhos sem danificar a árvore-mãe. Posso até tentar fazer mudas deles, mas não posso deixar onde estão. Ou seja, nesse caso não dá para não fazer nada. 

“Devem-se arrancar ou deixar estar estas ramificações? A dúvida é comum a muitas pessoas”, afirma Ana Carvalho, engenheira agrária. Ela explica:“Os rebentos chamam-se rebentos ou ramos ladrões. Devem ser removidos, uma vez que retiram a força de crescimento do tronco principal. Eles podem ser retirados em qualquer época do ano sem prejuízos para a árvore principal”. 

(Cléo, Chica, o manacá e os rebentos.) 


Na sua vida também é assim, mesmo que pareça que tudo vai florescer bem, nem sempre é possível deixar como está. Se vários novos caminhos se abrem a sua frente, você precisa escolher um. Mesmo que todos os caminhos que se abriram para você sejam maravilhosos, você vai ter que eliminar todos os outros que não foram escolhidos.

Não dá para não fazer nada, você realmente precisa escolher uma das muitas possibilidades. Precisa escolher, por exemplo, se quer a árvore ou rebento. Ou que caminho você vai querer trilhar, o antigo ou o novo que se apresenta. Precisa escolher quais rebentos, ou caminhos, serão descartados, e virarão adubos, que fortalecerão a sua escolha. Nada se perde. Só de parar e avaliar atentamente cada caminho para escolher um deles, você aprende e alimenta sua escolha com mais tranquilidade, consciência e confiança. Senão escolher, você perde todas s possibilidades.

Se você se conhece pouco, se vive uma incerteza com relação a quem é e o que quer da vida, possivelmente você tem dificuldades de fazer escolhas. Essa dificuldade faz de você uma pessoa apegada, alguém que se torna incapaz de abrir mão de qualquer opção, deixando tão difícil a tomada de qualquer decisão.

Pessoas apegadas adiam, enrolam e postergam indefinidamente suas tomadas de decisão. Esquecem que ao não escolher também fizeram uma escolha, já que a vida continua e existem consequências. Há sim uma perda quando se faz escolhas, e pode gerar sofrimento, mas cabe a você continuar da melhor maneira possível.

“Apegos perturbam a mente e nos impedem de agir com liberdade”, explica a monja Coen.“É preciso ter consciência se você está se apegando demais à comida, a uma pessoa, a uma situação qualquer e isso está atrapalhando os seus relacionamentos. É preciso distinguir os benefícios. Se é gostoso e saboroso, mas fiquei presa numa teia e vai me causar mal, é hora de desapegar”, ensina.“Tudo que começa a causar muitos impedimentos para a vida, deixa de ser uma coisa boa, deve ser desapegado”, completa.

Para desapegar, é importante ir pelo caminho do meio, desapegando até mesmo do desapego obrigatório. “Possuo uma velha roupa de monja. Olho para ela e são tantas as memórias de um certo mosteiro que não largo a roupa”, reconhece a monja.

Desapegar não é abandonar tudo, é ter equilíbrio, é soltar o que lhe causa impedimentos, é ter disposição de encarar os novos ciclos quando se apresentarem. É possível ser desapegado e ter desejos de viver de maneira confortável nesse mundo. Apesar disso, garante a monja Coen, o desapego liberta.

Pessoas desapegadas são mais tranquilas nas suas escolhas, se conhecem melhor, conhecem sua essência e sabem que perder alguma coisa, ou se distanciar de alguém, não muda sua verdadeira natureza. Pessoas desapegadas fazem as escolhas com mais compreensão, vivem com mais harmonia, calma e receptividade, especialmente quando mudar o caminho não for uma opção sua.

Fazer escolhas certas é uma questão de saber o que você está procurando com o resultado da sua decisão. É confiar que continua se movendo em direção dos seus objetivos, se renovando, aprendendo e se tornando uma pessoa melhor.

“Não há caminho errado, mas sei que há caminhos que trazem menos felicidade porque são caminhos desconectados de nossa essência. Somos seres projetados para sermos felizes e a felicidade está onde a essência está.” Paula Quintão


E se eu não fizer nada? Nada muda. E os caminhos que se abriram, deixam de existir.

6 comentários:

  1. Que reflexão gostosa de ler! O desapego consciente tem a magnífica capacidade de preencher de leveza os nossos caminhos. Uma prática importante...
    E agora estou curiosa para saber o nome dessa árvore tão perseverante!
    Abraço grande!
    Bárbara

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    1. Eu também Bárbara! Eu, meu jardineiro e a chuva não temos combinado... vamos tentar de novo na quarta, quem sabe ele conhece? Preencher de leveza, uma linda meta. Um beijo

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  2. E a satisfação quase infantil que a gente sente ao ver os brotos crescendo? Bela postagem, Érima, obrigada por compartilhar suas observações e seus conhecimentos!

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    1. De nada Su! Satisfação quase infantil é mesmo a sensação que dá. Beijos

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  3. Adorei, Érima! Estava precisando ler isso. :) Beijos! :*

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Vou ficar feliz com seu comentário. É muito bem vindo!